Por uma medicina sem prova dos 9

Há uma diferença entre a prova dos nove e a prova real? Há. As contas da mercearia acabaram por formatar o raciocínio final, influenciando o significado de cura em Medicina. Em saúde, o erro é sempre dividido pelo doente e pelo médico. Cabe à Matemática e à Medicina ajudar

A saúde é matemática. Se ainda não é, deveria ser! Múltiplas parcelas se adicionam, se subtraem, se multiplicam, ou dividem para que um Ser seja saudável. E, um Ser saudável só o será, se for feliz.

Por definição, saúde implica uma prova real de bem-estar físico e psíquico. Mas quantas vezes até acreditamos que estamos bem, que o diagnóstico ou tratamento deram os resultados desejados, mas a certeza mesmo, parece só chegar com a prova dos nove.

A prova dos “nove fora” pode fazer acreditar que a operação foi um sucesso, que a prótese escolhida está certa, que o doente escolheu bem o seu médico e que este fez o melhor pelo seu doente. Ambos ficam felizes e acreditam que todos os “ noves foram fora”.

A sabedoria chinesa acredita que o 8 é o número da sorte. O 9 é apenas o resultado da adição do 8, que representa a sorte que o doente necessita ter, e o 1 é o médico que o vai observar. 8 +1 = 9. Retirados os 9 (noves fora) sobra zero. Zero de doença é a cura ou a morte. Mas se ao 8 da sorte que o doente deseja ter, juntar -1 que o médico lhe adicionou, o resultado será menos saúde. Mas, menos saúde, não é necessariamente doença.

O intervalo entre o bem-estar e a doença é um intervalo variável, sujeito a neuro-adaptação, a fé, a tolerância… Em acreditar que poderia não ter sido melhor. Este é o intervalo em que a “ prova dos nove” está certa e a prova real não pode confirmar o êxito… o bem estar físico e psíquico do ex-doente.

O “Professor e o aluno” confirmam o resultado e concluíram que tudo estava bem, mas raciocinaram na base 10. As contas da mercearia ou do supermercado formataram o raciocínio final e influenciaram a cura… Todos saudáveis, todos felizes. Este resultado é o que sempre me preocupou ao longo do meu percurso como médico…

Muitas vezes analisei a prova dos nove, dividi, multipliquei, somei e subtrai procurando acreditar que as provas matemáticas se podem aplicar à Medicina.

1+1=2; 2+2=4; 3+3=6, etc. mas será?

Para muitos, a Medicina não é uma ciência exata. Nem nunca o será. E essa é uma premissa grave em que eu não me revejo… Contra a qual sempre tenho lutado. Os que me conhecem, sabem o que eu quero da Medicina, nada mais que uma ciência, como a Matemática e a Física e por isso a minha cirurgia recorre à medicina e à engenharia mecânica. Tal como continuo a mudar de base matemática para perceber a “operação” que vou realizar e como analiso esse mesmo resultado; como procuro as diferentes propriedades como uso o elemento inverso ou o oposto, como valorizo o elemento neutro, como evito multiplicar os erros ou dividir os sucessos.

Um erro médico é uma operação subtrativa de duas parcelas. A parcela doente e a parcela médico. O resultado é sempre menos saúde para o doente. Em medicina há duas parcelas em análise. Não há erro médico se não houver doente e não há erro médico se não houver médico Um erro em Medicina pode ter “a prova dos noves” certa, mas a prova real terá sempre de dividir o erro pelo doente e pelo Médico. Os dois têm que lutar por adicionar o melhor à saúde física e mental de ambos, mas também à Matemática de 1+1 que é, afinal, a Medicina.

António Travassos
(Médico oftalmologista)

Leave a reply